Uma análise da possibilidade jurídica do divórcio em caráter liminar.

Uma análise da possibilidade jurídica do divórcio em caráter liminar.

Recentes decisões jurídicas deferindo divórcio antes mesmo da citação da outra parte, ocorridas em alguns estados brasileiros, trazem novamente ao cenário jurídico a discussão sobre a possibilidade jurídica do divórcio em caráter liminar, inaudita altera parts. Essa possibilidade surgiu com a Emenda Constitucional n° 66/2010, que possibilitou o chamado divórcio direto. Para muitos juristas, a nova legislação constitucional deu ao divórcio status de direito potestativo incondicional, ou seja, para a dissolução do casamento basta a vontade de uma das partes, sem qualquer outra condição, sendo prescindível para isso a formação do contraditório.

Sendo então o divórcio um direito potestativo, o pedido feito por um dos cônjuges, peticionado com a correta documentação, seria suficiente para a decretação do mesmo, restando à citação a função de informar a outra parte da decisão. Pode ser estranho de início pensar que a sociedade conjugal pode ser dissolvida antes de o Requerido ser ouvido, mas, juridicamente falando, se é um direito potestativo não admite contestações. E não cabe ao juiz, imparcial, interferir na vontade das partes. 

Superada a questão material desta possibilidade, analisa-se a questão processual. O Código de Processo Civil (CPC), nos termos dos artigos 355 e 356, permite ao juiz decidir antecipadamente e parcialmente o mérito, se tratando de pedido incontroverso, que não necessite de outras provas, permitindo que aquele fato seja imediatamente julgado. Há também a possibilidade de encarar o pedido como tutela de evidência baseando-se no artigo 311. Como já dito anteriormente, estando a petição inicial munida dos documentos necessários, tratando-se de questão exclusiva de direito, nada impede o julgamento antecipado do mérito. Deferido o pedido de divórcio, o processo segue para o contraditório dos outros pedidos que tenham sido formulados. Assim, o litigante tem seu direito potestativo atendido, sem correr o risco de sofrer com a demora da citação do requerido, como ocorre nos casos em que este voluntariamente não colabora, evitando a citação, por não aceitar o fim da sociedade conjugal.  

Portanto, em tempos de buscar rapidez e eficácia no processo, impedir que um direito potestativo seja deferido liminarmente, não apenas fere o direito certo e líquido de alguém, como atrapalha o bom andamento processual. Ao Estado, aqui representado pelo judiciário, cabe apenas cumprir a lei. E ao cônjuge que recebe o divórcio, cabe, conforme a legislação, apenas o aceite. Neste sentido, já cantava Lulu Santos: “não imagine que te quero mal, apenas não te quero mais”. 

Fernanda Fernandes

Advogada e Consultora Jurídica nas áreas de Família, Trabalho e Empresarial. 

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